A Primeira Páscoa do Brasil
“Na armada de Pedro Alvares Cabral vinham alguns franciscanos, missionários da Índia. O superior deles, Frei Henrique de Coimbra, disse missa no recife da Coroa Vermelha, costa de Porto-Seguro, no dia 26 de Abril de 1500 (domingo de Páscoa). Assistiu a gente da armada e junto do Capitão via-se "a bandeira de Cristo, com que saíra de Belém, a qual esteve sempre alta da parte do Evangelho".
Alguns duzentos índios, com os seus arcos, andavam a distância na praia. O ato oficial da posse do Brasil realizou-se na sexta-feira seguinte, que era o primeiro de Maio. Em vez do habitual padrão arvorou-se uma cruz ou melhor uma cruz-padrão. Vítor Meireles e Pedro Peres fixaram em telas conhecidas esse ato augusto. Pedro Alvares mandára construir uma grande cruz, de madeira indígena.
Ao lado de Cabral assistiam Bartolomeu Dias, descobridor do Cabo da Boa-Esperança, Nicolau Coelho e outros heróis da índia. Estavam também presentes uns cinquenta ou sessenta índios da terra. Quando eles viram os Portugueses a carregar a cruz para o sítio onde se devia arvorar, chegaram-se e ajudaram-na a trazer. Foi o seu primeiro ato de cooperação. Não foi o último, naquela jornada célebre.
Durante a missa, quando se erguiam os Portugueses, erguiam-se os índios, e se ajoelhavam, ajoelhavam também. "E quando levantaram a Deus, que nos pusemos de joelhos, esses puseram todos assim, como nós estávamos, com as mãos levantadas, e em tal maneira sossegados, que certifico a Vossa Alteza que nos fez muita devoção". E esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza em ela deve lançar".
No primeiro contato de Portugal com o Brasil, ficou arvorada a Cruz. Era um símbolo e uma promessa. Mas não era ainda a semente. Esta viria, prolífica e abundante, quase meio século depois, em 1549, com a instituição do Governo Geral e a chegada dos Jesuítas”
“Os índios quando viram os portugueses desembarcarem no do mar, os chamavam de “Caraíbas” que eram mais respeitados que homens. Mas muito mais cresceu neles o respeito, quando viram oito frades da ordem do nosso padre São Francisco, que iam com Pedro Álvares Cabral, e por guardião o padre frei Henrique, que depois foi bispo de Cepta, o qual disse ali missa, e pregou, onde os gentios ao levantar da hóstia, e cálice se ajoelharam, e batiam nos peitos como faziam os cristãos, deixando-se bem nisto ver como Cristo senhor nosso neste divino Sacramento domina os gentios, que é o que a igreja canta no Invitatório de suas Matinas, dizendo: Christum regem dominantem gentibus, qui se manducantibus dat spiritus pinguedinem, venite adoremus.
Do Deus Pã, diziam os antigos gentios, que dominava e era senhor do Universo, e disseram verdade se o entenderam deste Pã divino; porque sem falta ele é o Deus que tudo domina, e apenas há lugar em toda a terra onde já não seja venerado, nem nação tão bárbara de que não seja querido e adorado, como estes Brasis bárbaros fizeram.
Bem quiseram os nossos frades, pela facilidade que nisto mostraram, para aceitarem a nossa fé católica, ficar-se ali, para os ensinarem e batizarem, mas o capitão-mor, que os levava para outra seara não menos importante, partiu daí a poucos dias com eles para a Índia, deixando ali uma cruz levantada como também dois portugueses degradados para que aprendessem a língua, e despediu um navio a Portugal, de que era capitão Gaspar de Lemos com a nova a el-rei d. Manuel, que a recebeu com o contentamento, que tão grande coisa, e tão pouco esperada merecia.”
Fonte: Páginas de História do Brasil. Serafim Leite, 1923/História do Brasil” (1627) do Frei Vicente do Salvador.
Júnior Sá
Colunista e Historiador.