A Noiva da Colina : 

                          ( Lendas de Piracicaba )


Conta-se que há muitos e muitos anos, quando a cidade não passava de um vilarejo, viveu por estas bandas um jovem casal de apaixonados que costumava encontrar-se todos os dias, ao entardecer, numa pequena colina às margens do caudaloso rio que dava nome à cidade.

A paixão que os unia era tão intensa que cada novo encontro tornava-se pura magia, graças ao cenário fantástico que os envolvia nesses idílios. Traçavam belos planos para o futuro que incluíam filhos para compartilhar esse grande amor. Sonhavam com uma casinha aconchegante e cheia de flores à beira do rio que amavam tanto e que sempre faria parte de suas vidas, já que Ari era pescador.

A cerimônia do casamento seria na capela, ornada com flores em profusão, de todos os matizes, pois plantas e flores eram a paixão de Iraci, a jovem casadoira.

A moça, vendo que a coroação do sonho estava próxima, sentia-se num verdadeiro paraíso onde só havia amor, encantamento e felicidade.

Às vésperas do casamento, tudo já estava mais ou menos encaminhado. O casal acertava os últimos detalhes sentado na barranca do rio, quando Ari vislumbrou  entre o vão das pedras, uma flor estranha e de inigualável beleza e decidiu colhê-la para sua amada já que ela gostava tanto de flores.

Foi cautelosamente escalando as pedras mais secas e logo chegou ao destino. Parou maravilhado pela rubra flor aveludada e ficou contemplando absorto as pétalas salpicadas de gotinhas furtacores, ansioso para entregá-la ao seu grande amor. Tão embevecido ficou que, pisando em falso, foi colhido de surpresa pela força truculenta da correnteza. Tentou lutar contra ela, mas a violência das águas era tanta que o pobre rapaz sucumbiu num redemoinho de espuma.

Iraci, que tudo assistia sem nada poder fazer, entrou em desespero e, num ímpeto ditado pelo coração, mandou-lhe um último beijo, pedindo a Deus que o acompanhasse.

Jamais encontraram o corpo do jovem tragado pelo rio, que nunca o devolveu. Para a donzela, que viu seus sonhos de amor desmoronarem, só restaram as lágrimas. Tudo perdeu o sentido, sua vida não tinha mais significado.

Todos os dias, religiosamente, ela rumava para a beira do rio e, na pequena colina, com os olhos perdidos no horizonte, sentia a aragem suave envolvendo-a, e fechava os olhos imaginando que era o seu amor afagando-lhe os cabelos como sempre fazia. Só assim conseguia um pouco de paz e conforto para aplacar sua dor pela imensa saudade.

Passaram-se os anos rapidamente. Os loiros cabelos, que a brisa do rio continuava a afagar mansamente, tornaram-se brancos como a espuma do rio e, todos os dias, a velha senhora era vista na colina perto do rio a derramar lágrimas de saudade pelo noivo engolido pelas águas traiçoeiras do rio.

Sua história perdeu-se entre tantas outras e diluiu-se no tempo. Mas há pescadores que juram de “pés juntos” que, ainda hoje, em noites sombrias, ouvem choro e lamentos longínquos. É o pranto eterno da noiva que, segundo a crença popular, continua misteriosamente a ecoar pelas cercanias do rio.

Não se tem certeza de sua veracidade, mas essa é uma das muitas histórias que são contadas pelos avós aos atentos netinhos  em noites de temporal e  passadas de geração em geração.

Em épocas de cheia do rio, quando as águas barrentas invadem com fúria as habitações ribeirinhas, dizem que são as lágrimas da moça pelo noivo perdido que fazem o rio transbordar. Pode ser mais uma história de pescador. Quem sabe?…

A cidade de Piracicaba é famosa, além das fronteiras, como a “Noiva da Colina”, e seu nome em tupi-guarani quer dizer “lugar onde o peixe pára”. Seu majestoso salto é conhecido como “Véu da Noiva”, pois desce as pedras em cascata, espumejando as águas até torná-las brancas como o tule farto que adorna a grinalda das noivas ao pé do altar.

Os nativos desta terra são apaixonados pelo rio e pela ”noiva”. Não há um só poeta ou escritor piracicabano que não tenha cantado em verso ou em prosa as suas belezas naturais.

E o imponente Rio Piracicaba, em seu eterno corcovear, leva para longe a história de amor dos dois amantes, que ficou para sempre em suas águas a vagar…

Por : Ivana Negri 


            Júnior Sá  

Colunista e Historiador

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