Por Daniele Ricci

O segundo sábado do mês de outubro, que em 2022 ocorre no dia 8, é dedicado a celebrar o Dia Mundial de Cuidados Paliativos. Este ano, o tema para a campanha é o tema deste ano é Curando Corações e Comunidades, porque traz à reflexão as milhares de vidas perdidas em acontecimentos dos últimos dois anos, como a pandemia de Covid-19 e a invasão russa à Ucrânia. Porém, tem surgido no Brasil vertentes que defendem focar o protagonismo dos cuidados paliativos no acolhimento a quem está com saúde debilitada e não apenas, como comumente acontece, no tratamento à beira da morte.

A ideia é que as pessoas enfermas possam ter seus desejos respeitados, suas vontades atendidas na experimentação de cuidados que prolonguem a vida com maior qualidade e sem o estresse do fim. Isso passa inicialmente pelo entendimento da importância dos cuidados paliativos.

De acordo com a The Worldwide Hospice Palliative Care Alliance (WHPCA), organização internacional não governamental que se concentra no desenvolvimento desse tratamento pelo mundo, cuidados paliativos são uma abordagem holística que visa otimizar a qualidade de vida. Há uma tendência das pessoas identificarem esses cuidados como alternativa a pacientes em fase terminal da vida. Mas esta é apenas uma parte da possibilidade. Cuidados paliativos se concentram no bem-estar espiritual, emocional e psicológico das famílias enlutadas.

Entretanto, é possível se pensar ainda mais longe. Cuidado paliativo é também o entendimento sobre o que a pessoa deseja, não no momento específico da morte, mas enquanto está com a saúde debilitada. Especialmente, como parte do direito de poder continuar a fazer planos em qualquer momento da vida. E cada dia mais profissionais de saúde têm se especializado em oferecer esse tratamento, que representa a possibilidade das pessoas terem respeitadas suas vontades nos momentos mais difíceis em relação à saúde.

Quando se fala sobre cuidados paliativos, a questão é o quanto vale lutar pela vida excluindo a má qualidade dos dias. Vale destacar, mais uma vez, que este tipo de tratamento não está relacionado necessariamente à morte. Pode estar também a doenças e debilidades que comprometem muito a saúde e o bem-estar da pessoa enferma.

O engenheiro de materiais Carlos Dion Teles, carioca radicado há 14 anos em Piracicaba-SP, é um defensor da nova proposta de cuidados paliativos. Embora não atue na área da saúde, o tema o motiva como missão que nasceu de experiências pessoais, tanto frustrantes como bem-sucedidas, envolvendo o próprio pai, o padrinho e a madrinha, pai e filha.

Aos 93 anos, o padrinho teve uma equipe médica cujo objetivo era fazê-lo sobreviver a qualquer custo, o que incluía biópsias, sondas e medicamentos fortes que o dopavam. “Não era esse tipo de tratamento que ele desejava antes de morrer, tendo já cumprido sua missão. Isso influenciou nas decisões de minha madrinha ao fim de sua própria vida. Ela deixou registrados quais caminhos deveríamos seguir quando chegasse a sua hora”, contou Dion.

Seu pedido priorizava qualidade para o restante da vida, permanecendo em casa para curtir o próprio espaço e as atividades que apreciava, como alimentar-se com o que gostava, observar o pôr do sol que ela amava, a beleza da chuva e seu barulho na calha, a alegria dos sobrinhos, o convívio com familiares e amigos, o rir dos pequenos tropeços. Para ela, tudo isso era considerado um sucesso em relação ao tratamento. “Precisamos ouvir e compreender quais os desejos e planos da pessoa. Minha madrinha deixou registrado como gostaria de ser tratada, o que deu aos afilhados a oportunidade de oferecer um fim muito mais digno a ela”, detalha.

O engenheiro, que hoje dedica-se a informar e divulgar a importância de cuidados paliativos, conta ainda que com o próprio pai o tratamento paliativo começou tardiamente, mas também foi importante para acolhê-lo. “Ele havia deixado claro que só continuaria se sacrificando se houvesse possibilidade de cura. A equipe de cuidados paliativos nos atendeu e ajudou, ele foi removido da UTI para o quarto, onde teve condições de receber os familiares e uma atenção especial.”

Em Piracicaba, a Santa Casa realizou nesta semana o 2º Simpósio de Cuidados Paliativos: Educação e Cuidados Paliativos para Todos, evento organizado por um grupo multidisciplinar, do qual Dion participou, honrando a herança de compromisso deixada pela madrinha.

Tanto na pandemia como na guerra, muitas famílias perderam entes queridos, um luto experienciado globalmente, deixando um vazio e a sensação de que era possível ter feito algo melhor. Por isso, a WHPCA elegeu o tema Curando Corações e Comunidades para esse ano.

A data celebrada mundialmente, no Brasil é uma ação unificada de apoio entre a organização e a Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP), voltada a incentivar a participação de todas as equipes do país e divulgar a necessidade desse trabalho.

O intuito é que mais profissionais e pessoas comuns ampliem seus conhecimentos e seus entendimentos sobre os cuidados paliativos e tudo o que esse tipo de medida pode proporcionar em momentos difíceis para pacientes e gente ao seu redor. É um respeito ao direito de escolha e de colher, nos momentos difíceis, a esperança de uma vida experimentada com dignidade.

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