Por
Adriana Passari - @adrianapassari
Que
horas são?
Quando
ela nasceu, o pai emocionado olhou para o relógio e registrou no fundo de sua
mente aquele horário mágico em que sua vida ganhava novas cores e uma medida de
amor que ele não conhecia antes, mesmo amando muito seus pais e sua esposa.
Ele e a esposa criaram aquela pequenina com muito amor, mas também com disciplina. Mantinha com ela longos e profundos diálogos, desde antes dela aprender a falar, quando os seus olhinhos escuros, grandes e redondos fixavam na origem daquela voz, e pareciam estar entendendo tudo. Tornaram-se grandes amigos. A mãe tinha muito orgulho da profunda relação amorosa dos dois e incentivava as oportunidades de convívio. Uma brincadeira que virou tradição entre eles era perguntar as horas um para o outro. A resposta nunca era simples. A mais criativa sempre valia mais pontos. Que horas são? É hora de enriquecer a mente com muitos aprendizados. Tradução: Hora de ir para a escola. Que horas são? Hora de retirar camadas de suor, gordura e poeira depositada na pele durante um extenso e cansativo dia. Tradução: Hora de tomar banho. Que horas são? Hora de utilizar o meu intelecto em prol da empresa contratante que garante o nosso sustento. Tradução: Hora de trabalhar. E por aí seguia a brincadeira. A princípio era o papai quem conseguia as respostas mais divertidas. Mas com o tempo, a pequena cresceu, assim como cresceu a sua perspicácia, as respostas foram ficando complexas e a competição acirrada. Que horas são? Hora de abastecer nutricionalmente o organismo responsável pela nossa transitoriedade vital. (Essa foi difícil) Tradução: Hora de comer. Na época da adolescência o pai foi proibido de fazer a brincadeira na frente dos amigos dela.
Ele teve que aceitar as mudanças trazidas pelo tempo. Que horas são? Hora de compreender, perdoar e respeitar as alterações hormonais e emocionais geradas pela puberdade de sua pequena preciosidade. Essa hora foi longa.
@estelamenegalli
Mas a família toda aprendeu
com os erros, acertos e dificuldades dessa temporada. Ela cresceu, se formou,
mudou de cidade. Que horas são? Hora de deixar voar as sementes pelos caminhos
da vida, ao encontro da evolução. Sempre que podiam estavam todos juntos
novamente, renovando os laços de amor. Mas as horas seguiam inexoráveis, e a
vida seguia seu curso natural. Em um certo dia, chegou aquela hora, que ninguém
sabe e nem quer saber, quando vai chegar. Nos momentos derradeiros de seu velho
pai, acamado e acometido por doença, a menina, já uma mulher madura, perguntou:
- Papai que horas são? É hora de trocar minha morada para viver dentro do seu
coração! Ela entendeu, era hora de chorar.
Ouça a história na voz de Adriana Passari:
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Um cisco no .eu olho... Lindo texto!!