Por
Adriana Passari - @adrianapassari
Apenas
mais uma história de dar medo
Era
meia noite de uma noite escura sem luar. Ela estava sozinha em casa, sem pressa
de ir para a cama, assistindo um filme antigo na TV, estirada no sofá, embaixo
de uma manta xadrez, tendo ao lado uma taça esvaziada várias vezes do seu vinho
favorito. A garrafa vazia também ao lado, no aparador. Há muito tempo ela não
tinha a oportunidade de ficar sozinha em casa e estava meio desacostumada. Todo
aquele silêncio. Sem ninguém para conversar ou dar ordens. Almejava por aquele
momento há meses.
Um
momento só seu, para escolher o que fazer e o que não fazer. Parecia até
perfeito demais. Deve ter cochilado no meio do filme porque ao acordar estava
chovendo e ela nem viu a chuva começar. Estava ainda sonolenta, um leve
pilequinho, de repente deu um salto assustada ao som de um estrondoso trovão.
A
tv estava fora do ar, só com chiado. Tentou trocar o canal mas foi em vão, os
canais a cabo estavam desconectados, provavelmente por alguma queda de energia
que ela nem percebeu. Desligou o aparelho e continuou olhando para a tela. E
agora? O que faço? Pela porta de vidro uns flashes causados pelos raios
iluminaram todo o quintal que deveria estar vazio. Deveria… mas o que era
aquilo? Teria mesmo visto um vulto? Pânico. Sentiu o coração acelerar até ouvir
os seus batimentos diretamente nos próprios ouvidos. Congelou. Não sabia o que
fazer. Um novo raio riscou o céu e a claridade revelou mais uma vez a imagem
que ela preferia que a escuridão continuasse escondendo. Havia mesmo um vulto.
Um homem. Vestindo uma casaca, chapéu e estava de costas para ela como se
mirasse para além do muro.
Desta
vez tomou uma atitude. Rapidamente, evitando fazer barulho, agarrou o celular e
correu até a fechadura da porta para certificar-se de que estava trancada.
Estava. Sentiu pequeno alívio, mas a chave não estava lá. Ele não poderia
entrar por lá, mas ela também não poderia sair.
Onde estaria a chave que nunca saía de lá? Estava tremendo e com dificuldade para discar para a polícia. Alguém atendeu: Polícia Militar, boa noite. Antes que ela respondesse, um novo raio seguido por estrondoso trovão, mostrou mais uma vez o cenário apavorante. O vulto agora estava mais próximo e desta vez a mirava nos olhos. Ela gritou, deixou o celular cair e a ligação foi encerrada. Ao mesmo tempo a energia da rua caiu e ela ficou sem luz… Nesse momento ela teve um surto de pânico. Gritou o mais alto que conseguiu, tateou no chão até achar o aparelho e com a pouca luminosidade da tela foi se guiando enquanto trombava nos móveis e paredes, em rota de fuga o mais rápido que conseguiu.
Chegou à porta da frente, escancarou sem pensar duas vezes e correu enlouquecidamente pelo meio da rua por mais de dez quarteirões. Chamou um Uber e foi para a delegacia mais próxima. Voltou para casa acompanhada de dois investigadores que revistaram a casa toda e nada encontraram de suspeito, além de uma taça de vinho e uma garrafa vazia… Será que ela teria imaginado tudo? Trancou toda a casa, portas e janelas, assim que eles a deixaram novamente sozinha.
Subiu para
o quarto, trancou a porta e se jogou na cama, escondida debaixo dos lençóis. Só
conseguiu pegar no sono quando os passarinhos cantavam e o sol já estava
raiando o dia. Acordou de ressaca mais
moral que etílica. Saiu do quarto aos poucos, reconquistando a confiança a cada
passo. Criou coragem e foi checar as câmeras de segurança. Nada ali comprovava
o motivo do seu terror. Mas também nada explicava os pequenos espaços de
estática nas imagens, e ainda pior, de onde veio aquele chapéu encontrado caído
encostado na porta de vidro pelo lado de fora sem nenhuma marca de pegada na
varanda.
Ouça a história na voz de Adriana Passari: