Por Adriana Passari – @adrianapassari

 

O ambulante

 

Ele estava dirigindo a caminho de trabalho como fazia todos os dias.

Orgulhava-se de sua dedicação e responsabilidade. Tinha um trabalho estável que garantia o sustento de sua família, dando a eles condições de vida melhores do que os seus pais puderam proporcionar. Neste dia em especial notou a presença de um vendedor ambulante abordando os veículos no semáforo.

O jovem bem apessoado, vestido com correção, se passaria facilmente por um cliente qualquer da empresa em que prestava serviços. Talvez por isso aquela figura tenha lhe saltado aos olhos naquele dia comum. Afinal, todos os dias ele dispensava pedintes e vendedores com apenas um gesto das mãos indicando negativamente, sem nem ao menos abrir o vidro para lhes ouvir a oferta. Muitas vezes até optava por fechar o vidro antes mesmo da aproximação dos suspeitos, afinal era uma questão de segurança.

Mas não naquele dia. Naquele dia, aquela presença se impôs à sua vontade, e sorrindo respeitosamente se aproximou da janela e ofereceu um pequeno pacote de balas de hortelã. Hortelã era seu sabor favorito de bala. Especialmente antes de atender algum cliente importante, era preciso garantir um hálito saudável e agradável. Sacou algumas moedas de um compartimento do carro, perto do freio de mão e comprou as balas. Sentiu-se bem ajudando aquele cidadão que estava provavelmente passando por um momento difícil.

Ao longo das próximas semanas o ambulante continuou oferecendo produtos aos motoristas e vez ou outra ele mesmo acabava por comprar novamente, não só as balas, mas parecia que o rapaz sabia o que ele estava precisando. Certa vez foi uma caneta, na outra uma água gelada e até um carregador de celular que acabou sendo muito útil.


O ambulante agora tinha um tabuleiro bem feito, com a variedade de produtos bem dispostos e uma marca própria desenhada @oquevoceprecisa? Parecia que os negócios estavam evoluindo.

Ele mantinha uma estrutura organizada com produtos para reposição e circulava com disposição entre os veículos apresentando o tabuleiro completo de opções. Um tempo depois deixou de ver o rapaz no semáforo, estranhou sua ausência, mas acabou esquecendo e seguiu sua rotina com o vidro do carro fechado para o mundo exterior. Só foi recordar do ambulante anos mais tarde quando o reconheceu sendo entrevistado em um programa de rádio, muito famoso também na internet. O jovem estava um pouco mais maduro, vestindo um elegante terno, todo moderninho, e explicava sobre o sucesso da sua empresa de vendas de produtos pela internet que já empregava mais de uma centena de pessoas e movimentava alguns milhões de reais. O mais surpreendente porém foi que em vez de orgulho, por ter ajudado aquele empresário no início de sua trajetória, ele sentiu uma amargurada inveja, difícil de engolir.

Ouça a história na voz de Adriana Passari:

 


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