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Artigo - Barjas Negri - Adivinhe para quem eu dei carona?

Publicada em: 08/09/2025 14:13 -

Adivinhe para quem eu dei carona?

 

 

Barjas Negri

 

Durante o período de 1997 a 2001, exerci o cargo de Secretário Executivo do Ministério da Saúde. Uma das principais atribuições era elaborar e acompanhar a execução orçamentária do ministério e de seus hospitais vinculados.

Em Porto Alegre (RS), destacava-se o Grupo Hospitalar Conceição (GHC), um dos mais importantes complexos hospitalares da região Sul do Brasil. Assim como o Hospital das Clínicas é referência para São Paulo, o GHC cumpria esse papel para a população gaúcha. Para se ter uma ideia da sua grandiosidade, o GHC conta hoje com mais de 10 mil funcionários e realiza mais de um milhão de consultas e mais de 27 mil cirurgias por ano — um volume impressionante de atendimento público de saúde.

A estrutura do GHC é de uma empresa pública, com um Conselho Administrativo que reúne representantes de diversos órgãos, entre eles o Ministério da Saúde, que detinha uma cadeira. Por cerca de dois anos, fui indicado para representar o Ministério nesse conselho, o que exigia minha presença em Porto Alegre com certa regularidade.

Para não comprometer a rotina de trabalho semanal no ministério, as reuniões do conselho foram agendadas sempre aos sábados, das 9h às 12h. Assim, eu podia me deslocar de Brasília a Porto Alegre nas noites de sexta-feira e, após a reunião, seguir de Porto Alegre para Campinas no sábado à tarde, podendo ainda passar os finais de semana com a família em Piracicaba.

Em um desses sábados, após cumprir a agenda do Conselho, cheguei ao Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre, para embarcar no voo com destino a Campinas (Viracopos). Enquanto aguardava o embarque, notei a presença de um casal famoso, que aguardava o mesmo voo. Imaginei que também estivessem indo a Piracicaba — e, de fato, estavam.

Após o desembarque em Campinas, enquanto eu aguardava meu carro, percebi que o casal também aguardava um transporte que parecia estar atrasado. Me aproximei, me apresentei como piracicabano e perguntei se precisavam de ajuda. Disseram que sim, que estavam indo para Piracicaba, convidados para participar do tradicional Salão Internacional de Humor, mas que o veículo da Prefeitura, responsável pelo translado, ainda não havia aparecido.

Diante da situação, ofereci carona. Num primeiro momento, hesitaram, mas, diante da demora, aceitaram a gentileza. No trajeto até Piracicaba, tivemos uma conversa bastante agradável. Falamos sobre a cidade, sobre a importância cultural do Salão Internacional de Humor, e aproveitei para manifestar minha admiração pelo trabalho — desde as suas crônicas, como A Velhinha de Taubaté, até suas participações nos salões de humor dos anos 1980, uma vez que Luiz Fernando Veríssimo era reconhecido escritor brasileiro e se destacava como cartunista, com obras publicadas em importantes jornais brasileiros.

Ao chegarmos ao New Life Apart Hotel, onde Luiz Fernando Veríssimo e sua esposa Lúcia Helena Massa se hospedaram, fiz questão de pedir desculpas, em nome da cidade, pela falha da organização, mas afirmei, com convicção, que a presença de Luiz Fernando Veríssimo certamente engrandeceria mais uma vez o Salão Internacional de Humor de Piracicaba.

Foi um encontro inesperado, mas marcante — uma daquelas histórias em que a vida nos surpreende e nos presenteia com momentos inesquecíveis, misturando responsabilidade pública, gentileza e a rara oportunidade de partilhar a estrada com um dos maiores nomes da literatura e do humor brasileiros.

No sábado, 30 de agosto, Luiz Fernando Veríssimo nos deixou, em Porto Alegre. Sua partida entristece o Brasil, mas sua obra, seu humor e sua humanidade permanecem vivos. Deixo aqui meu carinho e respeito aos familiares, amigos e leitores, com a certeza de que Veríssimo seguirá inspirando gerações com sua inteligência e sensibilidade únicas.

 

Barjas Negri foi ministro da Saúde e prefeito de Piracicaba por três gestões

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