Por Adriana Passari - @adrianapassari

 

Espelho, espelho meu

 

Ela era uma moça tão linda, tão linda. E vaidosa. Cuidava de sua saúde e beleza com extremada dedicação. Era sempre elogiada por onde passava. Todos a conheciam e sorriam ao vê-la passar.

Mas um dia, sem explicação, um estranho fenômeno aconteceu: ela ficou feia. Era a mesma moça, os mesmos traços, mas se olhava no espelho e estava feia. Não entendia. Como podia ter dormido tão bela e acordar tão feia. Não sabia o que fazer. Nunca foi feia na vida, portanto não sabia como as feias deviam se comportar. Correu para o chuveiro na esperança de ver a água e os inúmeros cosméticos levarem aquela feiura embora. Lavou o rosto, o corpo e os cabelos. Usos ou melhores e mais perfumados sabonetes. Saiu do banho com esperança de ser a bela da rua novamente. Escovou os cabelos como de costume, passou perfume e voltou a olhar para o espelho. Em vão. Continuava feia. Não sabia como agir e nem como pensar.

Ficou minutos paralisada como quem está no meio de um sonho e tenta correr, mas o corpo não reage. Essa era a sensação. Algo muito errado estava acontecendo. Não pretendia dar as caras na rua enquanto não resolvesse a situação. Avisou seu chefe que iria trabalhar em casa, já que tinha autonomia de optar pelo home office.


@willian_hussar

Agarrou seus kits todos de maquiagem e começou os trabalhos para consertar o que o universo havia bagunçado. Camadas de base, corretivos, pó compacto, solto e translúcido, blush, sombras, rímel, fixador, iluminador e tudo o mais que apareceu na bolsa. Ajeitou os cabelos, mudou a roupa e agora sim, estava aliviada, poderia se ver novamente, como estava acostumada. Foi ao espelho. Chegou perto de olhos fechados, estava nervosa. Abriu os olhos e o desaforado do espelho atirou em sua cara a dolorosa verdade: continuava feia. Era bem verdade que agora era uma feia arrumadinha.

Desistiu de ficar em casa, precisava respirar, jogou um lenço no pescoço e com ele cobria parte do rosto. Andando pelas ruas percebeu que as pessoas continuavam as mesmas. Ninguém estranhou aquela mulher feia andando pelos mesmos caminhos onde a bela costumava passar. No escritório foi recebida com o carinho de sempre. Os mesmos olhares e os mesmos sorrisos. Foi se desarmando. A rotina de trabalho desviou seu foco para as altas demandas do dia. Terminou a jornada e rumou para casa mais confiante do que saíra. Esqueceu de cobrir o rosto com o lenço. Chegou em casa e foi direto ao espelho venenoso. Sem olhar atirou o lenço sobre ele. Embrulhou o mentiroso com jornais velhos e atirou ao lixo, tendo o cuidado de não quebrar, afinal, não queria sete anos de azar. E assim, eliminado o culpado, foi dormir e acordou na manhã seguinte tão bela como sempre foi.

Ouça a história na voz de Adriana Passari:

 


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