Robert Prevost sai de cena e dá lugar para Leão XIV
Ronaldo Castilho
A eleição de Robert Francis Prevost como novo Papa — agora Leão XIV — marca uma nova fase na longa e complexa trajetória da Igreja Católica. Ao aceitar a missão de guiar mais de 1,3 bilhão de fiéis em um momento de profundas transformações sociais e desafios internos, Prevost não apenas assume uma posição de liderança espiritual, mas também se torna símbolo de uma transição delicada: o equilíbrio entre tradição e renovação.
Cardeal americano de origem, Prevost já vinha se destacando nos bastidores do Vaticano, especialmente por seu trabalho na Congregação para os Bispos e sua proximidade com o Papa Francisco. Sua escolha parece ter sido calculada: alguém que une o respeito pela doutrina com a sensibilidade pastoral exigida pelos tempos atuais. Ao adotar o nome de Leão XIV — evocando pontífices históricos como Leão XIII, defensor da justiça social e dos direitos dos trabalhadores — o novo Papa sinaliza continuidade com uma visão de Igreja mais engajada e atenta às dores do mundo moderno.
Mas é preciso reconhecer que a escolha também carrega riscos. A Igreja enfrenta tensões internas, entre alas progressistas e conservadoras. Há quem veja em Prevost uma tentativa de manter o espírito reformador de Francisco, enquanto outros esperavam um retorno a uma postura mais rígida e doutrinária. O desafio de Leão XIV será manter a unidade do colégio episcopal, escutando a diversidade de vozes dentro do catolicismo sem perder a coerência da fé que professa.
O mundo que Leão XIV herda como pastor universal é profundamente polarizado. As crises migratórias, as guerras, o avanço do secularismo e os escândalos de abusos dentro da própria Igreja tornam sua missão ainda mais árdua. Contudo, sua experiência missionária, sua formação acadêmica sólida e sua escuta próxima dos pobres o colocam em posição privilegiada para conduzir a Igreja com humildade e firmeza.
Robert Prevost, ao “sair de cena” como cardeal e assumir o trono de Pedro como Leão XIV, não apenas muda de nome: ele se transforma em uma figura de esperança para milhões. Esperança de que a Igreja possa ser farol, e não fortaleza. Esperança de que a fé dialogue com a razão e com a realidade. Esperança, por fim, de que, mesmo em tempos sombrios, o amor de Cristo continue sendo proclamado com coragem e compaixão.
Contudo, é importante sublinhar um ponto essencial: a verdadeira mudança na vida de Robert Prevost não aconteceu no momento em que os cardeais o elegeram Papa. A mudança se deu quando ele respondeu: “Aceito”. Nesse instante, ele não apenas acolheu um título, mas assumiu o peso espiritual, moral e histórico de ser o sucessor de Pedro. Essa aceitação não foi um gesto simbólico, mas uma entrega radical, onde ele abdicou de sua individualidade para se tornar guia universal da fé católica. Ao aceitar, Prevost desaparece — e é Leão XIV quem nasce.
Leão XIV também será testado quanto à sua capacidade de dar continuidade às reformas internas iniciadas por Francisco. Questões como a descentralização da autoridade romana, a revisão do papel das mulheres na Igreja e a atenção pastoral aos divorciados e à comunidade LGBTQIA+ continuam sendo pontos de tensão e debate. O novo Papa precisará demonstrar sabedoria para avançar com passos firmes, sem provocar rupturas irreparáveis.
Além disso, o Papa enfrenta o desafio de reconquistar a juventude católica, especialmente nas regiões onde o catolicismo sofre maior perda de fiéis, como na Europa e em partes da América Latina. O distanciamento entre o discurso institucional e a vida cotidiana dos jovens é um abismo que precisa ser preenchido com ações concretas, linguagem acessível e presença pastoral autêntica.
A escolha de um papa norte-americano também não é irrelevante. Pela primeira vez, um pontífice vindo dos Estados Unidos assume o comando da Igreja, o que pode representar uma nova dinâmica diplomática e geopolítica dentro da Santa Sé. A relação com outras religiões, com os poderes políticos e com os continentes historicamente marginalizados dependerá de como Leão XIV equilibra seu olhar global com uma espiritualidade enraizada nos valores evangélicos.
Internamente, o novo Papa terá de lidar com a burocracia vaticana — muitas vezes resistente a mudanças — e com setores que ainda tratam escândalos de abusos com silêncio ou omissão. A transparência, a justiça e a escuta das vítimas não podem ser apenas promessas, mas prioridades concretas e visíveis desde os primeiros dias do novo pontificado.
Em meio a tudo isso, Leão XIV terá que ser mais do que um gestor ou teólogo: precisará ser um pastor, no sentido mais puro da palavra. Alguém que caminha com o povo, que escuta antes de falar, que chora com os que sofrem e que sonha com um mundo onde o Evangelho não seja apenas anunciado, mas vivido. Que ele tenha sabedoria divina, coragem humana e o coração de Cristo para enfrentar esse imenso chamado.
Ronaldo Castilho é jornalista, bacharel em Teologia e Ciência Política com MBA em Gestão Pública com Ênfase em Cidade Inteligente