Por Adriana Passari - @adrianapassari

 

O buraco e o sapo

 

Férias escolares eram sempre uma alegria. Nós contávamos os dias faltantes com entusiasmo como se fosse o final de uma maratona com subida na reta final. O fôlego ia esgotando, os músculos já não respondiam, o cérebro entrava no automático.

E então aquela última sexta-feira de junho tão esperada chegava e estávamos oficialmente liberados por 30 dias. Parecia uma eternidade de tempo para fazer o que queríamos. E o que queríamos? Fazer nada. Naquele tempo nossas férias não exigiam planejamento. Era apenas a liberdade de acordar e não ter que colocar uniforme, organizar a mochila e ir para a escola. Naquele ano, o Zoológico da cidade ofereceu uma atividade: férias no zoo. Pareceu uma boa ideia.

Uma ótima ideia na verdade. Mamãe e papai fizeram nossas inscrições, junto com alguns amigos mais próximos. Seriam alguns dias de aprendizado sobre os animais e a natureza, encerrando com uma noite de acampamento dentro do zoo. As aulas foram incríveis, aprendemos sobre os hábitos e alimentação dos animais. Pudemos passar a mão em dois filhotes de leão e até em uma cobra de verdade.

Claro que tudo isso sob o controle e supervisão dos biólogos, polícia ambiental e sei lá mais quem. Inesquecíveis. Tudo ia muito bem. A noite do acampamento foi a mais esperada e temida. O grupo de escoteiros foi convidado a montar as barracas para acomodar os participantes durante a noite. Os pais, tão ou mais ansiosos que os filhos, acompanharam as montagens de perto, num horário que normalmente o zoológico já estava fechado para visitação, mas estávamos lá dentro, era tudo muito emocionante.


@fer_nepomuceno

Os pais então se despediram e ficamos sob a tutela dos monitores com uma bagagem cheia de inseguranças e ansiedade. Fomos encaminhados para identificar nossa barraca, nos acomodar e depositamos nossas mochilas. Nosso “alojamento” acolheu cinco crianças. Uma delas levava uma garrafa de coca-cola daquela de vidro e acabou derramando em parte dos acolchoados onde passaríamos a noite. Tivemos que nos amontoar no canto que estava seco e não foi uma noite tão agradável para se dormir. Mas antes de dormir, uma outra história marcou para sempre essa noite. Fomos todos chamados para um passeio onde observamos animais de hábitos noturnos.

A noite estava fria e fizeram (novamente os escoteiros) uma fogueira onde todos se reuniram para lanchar e ouvir histórias. Quando levantei a caminho do banheiro vi umas crianças olhando para o chão, atirando pedras e rindo. Me aproximei por curiosidade.  Um deles me disse que naquele buraco havia um sapo. Um garoto atirou uma nova pedra e o outro ao seu lado também. E foi aí que eu saí em defesa do sapo. Gritei e agarrei seus braços impedindo novos lançamentos.

Eles gritaram de volta e riram de mim. Eu chorava e tremia, de raiva e de medo. Os professores percebendo a confusão logo chegaram e acalmaram todos, nos tirando de lá. Só parei de chorar porque eles iam ligar para os meus pais irem me buscar. Eu não vi o sapo sair do buraco, nem sei se havia de fato um sapo naquele buraco. Mas eu nunca mais me esqueci dele.

Ouça a história na voz de Adriana Passari:

 

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