O Canal da Lili
E ainda diziam que a
pandemia de Covid 19 faria de nós, pobres mortais, seres melhores
Eliana Teixeira
Mais que estrelas
brilhando pelo famoso tapete vermelho, no último domingo (27), a cerimônia do
Oscar 2022 deixou o público de celebridades de Hollywood, bem como cinéfilos que
acompanhavam a premiação ao redor do mundo, sem saber se era realidade ou
encenação o tapa desferido por Will Smith em Chris Rock. A cena, que não fazia
parte do script da cerimônia, aconteceu após o comediante Chris Rock - que
apresentava o prêmio de melhor documentário – sorridentemente dizer que mal
podia esperar para ver Jada Pinkett Smith estrelar "G.I. Jane 2",
numa referência ao longa de 1997, "G.I. Jane", estrelado pela atriz
Demi Moore, que raspou os cabelos para dar vida a uma tenente no filme
conhecido no Brasil como "Até o limite da honra".
Jada, esposa de Will
Smith, literalmente sofre de alopecia, doença que causa a queda de cabelos.
Digo literalmente sofre, porque como mulher posso imaginar a dor que é para
outra perder os cabelos, que são marcantes para a feminilidade. Para quem é uma
atriz, a perda dos cabelos pode ser ainda mais difícil de se lidar.
A exposição da imagem, a
competitividade entre talentos e egos inflados, a luta pela eterna juventude e beleza
padronizadas pela própria indústria cinematográfica, os desfiles de grifes
absurdamente caras para garantir o look mais clicado pelas lentes e pelos
milhões de likes em redes sociais, tudo isso já é um peso tremendo no mundo
hollywoodiano e sabemos que alguns artistas talentosíssimos não resistem à
pressão, sucumbem à depressão, ao alcoolismo e uso de drogas ilícitas. Agora,
dá para imaginar o que é para alguém que vive um momento de fragilidade ter que
lidar com o escárnio de quem ultrapassa os limites da humanidade para fazer
“piada” com a doença alheia?
O público repleto de
celebridades somente entendeu que não era um jogo de cenas, quando Will Smith –
o vencedor do prêmio de melhor ator pelo documentário "King Richard:
criando campeãs" – voltou para seu lugar e gritou a Chris Rock que deixasse
o nome da mulher dele fora de sua boca. Parecia surreal. E só assim, o público,
que chegou a rir da situação, silenciou-se.
A Academia de Artes e
Ciências Cinematográficas, organizadora do Oscar, se pronunciou, na madrugada
do dia 28, com nota postada no Twitter: "A Academia não tolera violência
de qualquer forma. Esta noite temos o prazer de celebrar nossos vencedores do
94º Oscar, que merecem este momento de reconhecimento de seus colegas e amantes
do cinema em todo o mundo".
Obviamente, a agressão
física não é a saída para problema algum. E o escárnio, os comportamentos
abusivos, quando é que serão apontados publicamente como falta de humanidade,
de respeito ao próximo?
Muitas vezes, quem agride
com escárnio ou mesmo com palavras aparentemente "suaves", porém com
a intenção abusiva, é muito mais violento do que aquele que "perde" a
razão e parte para a agressão física. A atitude do Will Smith representa o
cansaço de quem tem que lidar com seres como Chris Rock. Eu me entristeço pelo
Will – há especulações de que a Academia poderia tirar o Oscar dele - e por
todos que lidam com a falta de humanismo, com as ações de pessoas abusivas.
A agressão física não é o
caminho para se resolver situações, sejam elas quais forem. E sejam quais forem
as situações de outros indivíduos, não são ou não deveriam ser piadas nem tão
pouco deveriam servir de distração a outras pessoas. E ainda diziam que a
pandemia de Covid 19 faria de nós, pobres mortais, seres melhores...
Eliana Teixeira é
pós-graduada em Gestão de Pessoas e jornalista – Acesse o site: https://www.ocanaldalili.com.br/